quinta-feira, 6 de maio de 2010

Personal Esperanto

Você quer savukinkku ou savustettu kalkkuna?
Prefere lähdevesi ou kivennäivesi?

A vida aqui tem sido muito boa, e, como várias pessoas já haviam adiantado, praticamente todos nas ruas falam, ou ao menos entendem bem e se fazem comunicar, em inglês, ainda que seja uma interação de frases curtas e básicas.

O problema começa com a inevitável, ao menos para mim, ansiedade de leitura. E isso vai das placas das ruas às revistas nas bancas. Claro que estamos em um país culturalmente ocidental, e dá para diferenciar uma revista de fofoca de uma mais séria só pela diagramação. Ainda assim, é frustrante não entender as manchetes dos jornais, ou entrar em uma livraria e ficar restrito a um cantinho de livros em inglês.

O drama – na verdade, possivelmente a comédia – maior acontece no supermercado. Há marcas e produtos universalmente reconhecidos, como Confort, OMO, Dove, e Activia (e me pergunto se Patrícia Travassos indagaria muito naturalmente, até em finlandês: “escuta, como está sua digestão?”). Outros, entretanto, são completamente desconhecidos, e é na decisão fina que o analfabetismo ataca.

Na maioria das vezes, apelamos para a abordagem pictórica. Uma garrafa de óleo de canola é identificável porque tem uma foto de canola nela (embora eu só tivesse reparado nisso a partir do momento em que precisei reparar). Mas como saber de que sabor é aquele refrigerante local, que você nunca viu, e que seria uma experiência enriquecedora de fuga da coca-cola nossa de cada dia?   E como saber em detalhes quais os ingredientes daquela sopa pré-pronta, que você já deduziu que é de legumes, mas que gostaria de saber quais? Resultado: na maioria das vezes compra-se na tentativa-e-erro, torcendo para acertar. Até que a estratégia não tem causado muitos desastres.

Outra sensação divertida e estranha é começar a contar com o “menos difícil”  para ajudar. A Finlândia é um país bilíngue: os 600 anos sob domínio da Suécia deixaram esse traço na cultura local. Isso significa que existem versões em finlandês e em sueco em todos os lugares, desde nomes das ruas até as legendas nos cinemas. Igualmente, nos rótulos dos produtos, os ingredientes estão lá nas duas línguas.

Nem eu nem Flávia flertamos nem longinquamente com a ideia de falar sueco... Mas usamos nossas muitas habilidades em inglês – língua da mesma família -, alem do fracês, espanhol e o que mais vier na cabeça para nos aproximar dos significados corretos. Assim, o sukker sueco só pode ser o sugar inglês; o refrigerante “Pommac” é da macã francesa (pomme), e a persilja finlandesa é quase igual à salsa espanhola (perejil).

Tudo bem que essa ousadia às vezes nos derruba... appelsiini (laranja, em finlandês), não tem nada a ver com Apple (“maçã”, na Inglaterra e na casa do Steve Jobs) e porkkana não é referencia aos palmeirenses – significa  “cenoura”.

E é nesse personal esperanto que a gente vai se virando por aqui, inclusive para requintar a comunicação interpessoal. Como tudo na minha vida nos últimos quase três anos, quem vai salvar o dia é a Flávia, que começará em breve as aulas de finlandês. Ainda bem que tem ela por aqui.

Em tempo:
savukinkku = presunto defumado
savustettu kalkkuna = peito de peru defumado
lähdevesi = água sem gás
kivennäivesi = água com gás

4 comentários:

  1. Na verdade, appelsiini tem muito a ver com apple:) Appelsiini (ou apelsin em sueco, Apfelsine em alemão) vem de "maçã chinês" (Apfel+sine). A palavra holandesa "sinaapsappel" tem a mesma ideia.

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  2. Meu favorido é peruna (batata): é originária do Perú; então Perú+na:)

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  3. Está ótimo isso aqui... bookmarqueei!

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  4. Gente... imagine como deve ser pedir um misto quente? Deus me livre... vou pro Mc Donald`s e empunho o número 1... sem dúvidas!

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