quarta-feira, 11 de abril de 2012

Memorabília: De volta ao Brasil (interlúdio)

Conexões lusitanas

A cultura e o imaginário brasileiro está repleto de construções conceituais e referências diversas às cadeias de raciocínio e às opções de elocução por parte de nossos ex-metropolitanos portugueses. Como diplomata, é parte do meu treinamento e, ousaria dizer, do meu dever de ofício desconstruir preconceitos arraigados nesses estereótipos. Mas às vezes os próprios objetos dessas visões limitadas não ajudam…

O itinerário mais direto que levava de Helsinque a Brasília, e evitava a obrigação de passar por Rio ou por São Paulo, previa uma conexão em Lisboa. A desvantagem dos voos era a permanência em solo durante longas horas, embora isso permitisse algum tempo para descanso e passeio.  

Eu já visitara a capital portuguesa em outras oportunidades, o que me fez dar preferência por reservar um hotel próximo ao Aeroporto da Portela, dormir um pouco, e, quem sabe, passear no Centro Comercial Vasco da Gama, para matar o tempo.

Entrei no táxi na saída do Aeroporto, ainda grogue de sono, devido ao horário ingrato da partida desde Helsinque – 5 horas da manhã – e recebi a primeira garantia que não estava mais na Finlândia. Ao instruir o motorista, comentei que iria para um hotel não muito longe dali. O patrício retrucou, nada carinhoso…

- “Ora, mas se é perto, porque é que não vais a pé?”

A falta de energia me impediu de responder algo à altura, que envolvesse a referência à genealogias ou orifícios corporais. Sorri amarelo, paguei a corrida – sem gorjeta, obviamente - e dormi boas horas de sono garantidas por um early check in.

Como programado, almocei no Vasco da Gama, e pude reparar que a quase totalidade dos atendentes em restaurantes ou lanchonetes eram ou brasileiros, ou nacionais de países africanos de língua portuguesa. De certa forma, isso aumentava a simpatia do serviço. Outra rápida percepção foi a de o custo de vida em Lisboa era bem mais baixo do que em Helsinque, a julgar pelo preço dos alimentos.
 
Uma sessão de cinema e um passeio pela FNAC deram sequência à tarde agradável. Senti um daqueles pequenos prazeres da vida ao entender as manchetes nos jornais e revistas. Mal tinha noção do quanto isso fazia falta no dia-a-dia de semi-analfabetismo em Helsinque.

Entender a língua local me fez, em seguida, não conter o riso, ao passar pelas prateleiras de filmes à venda, e reparar as curiosas diferenças entre Brasil e Portugal, nas traduções dos títulos dos filmes. Assim, “O Planeta dos Macados” anuncia “O homem que veio do futuro”, “Um corpo que cai” é “A mulher que viveu duas vezes” e o “Cidadão Kane” tem “O mundo a seus pés”.

Percebi que era hora de voltar ao aeroporto e desistir momentaneamente de Portugal quando decidi tomar um café no quiosque mais próximo. Relato, sem adaptações ou comentários:

- Por favor, um expresso duplo.
- Na xícara grande ou na xícara pequena?

 (sem entender bem a razão da pergunta, mas optando pela segurança):

- Uhmm.. na xícara grande?
- Ai, que bom, então… Não iria mesmo caber na xícara pequena…


Fim do interlúdio

(continua)

5 comentários:

  1. à boleia pela galáxia... prefiro o nosso guia do mochileiro =D

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  2. Muito fixe tua aventura, gajo rs. Sorte que ainda falaram xícara, geralmente usam 'chávena'.

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  3. juro que nao sei o que pensar sobre o tal café duplo... Pra que eles perguntam?

    nada como uma conexão em LIS para aliviar a tensão de horas de viagem...

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  4. Gosto muito dos Tugas. Muito agradável Portugal e as vezes engraçado, divertido, leve. Grosseria mesmo senti em Londres...

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  5. Não sei qual é o fuso de Helsinque, mas o curioso é que o voo da TAP sai às 9:30(hora de Lisboa) e não sei como você conseguiu fazer tantas coisas por Lisboa em tempo, aparentemente para mim, exíguo. Parabéns pelo dinamismo.

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